A pergunta do médico
Hoje ouvi os pais de um menino de três anos que iludiu, durante dois fatais minutos, a atenção de ambos e caiu a um pequeno tanque da quinta onde viviam, tanque esse que tinha uns míseros 40 cm de profundidade de água que lhe roubaram a vida em instantes.
Perguntei à mãe se sabia qual o motivo de estar a ser ouvida.
E já nem o nome conseguiu dizer sem ser entre soluços e lágrimas.
O pai contou com todos os pormenores todos os segundos daquele momento e dos que se lhe seguiram.
Como se tivesse necessidade de explicar em voz alta. Como para se convencer de que esta era a realidade.
Perguntou pela causa de morte. E se tinham sido colhidos órgãos para transplante.
Contou-me que o médico lhe comunicou a morte cerebral irreversível do seu filho e lhe perguntou se consentia na colheita de órgãos para transplante.
Que o médico esperava que a reacção dele fosse gritar, chorar, prantear e, quem sabe, agarrá-lo pelos colarinhos e encostá-lo a uma parede.
Contou-me ainda que a sua reacção foi dizer 'que a desgraça da minha família possa fazer outra família feliz!'.
E que a do médico foi entrar na sala onde o seu filho jazia ligado a uma máquina, dar dois murros na parede, dizer três palavrões e perguntar 'Onde diabo estava Deus quando isto aconteceu...?'.
Acabei o auto.
Em silêncio, com os olhos rasos de lágrimas e o queixo a tremer.
E com a pergunta do médico na cabeça, confesso.
Comentários
Considera-o entregue. :D
Deus morreu... vai p'ra mais de uma eternidade...
Narazie.
Ainda bem que alguém sabe destas coisas...e é meu amigo! :D