É melhor ser criado por uma mãe ex-prostituta do que por uma avó rato-de-sacristia

É a conclusão do dia de hoje.

Há coisas que me indignam e que fazem as minhas segundas-feiras serem mais 'segunda-feira' ainda do que o habitual.

Gosto de pensar que sou liberal. E que não sou, por regra, preconceituosa.
Mas devo confessar que, quando a religião passa a funcionar como uma limitação daquilo que, em termos - se calhar, demasiado utópicos! - é bom e justo, fico verdadeiramente zangada.

Menino de nove anos. Até aos oito, acreditou que os avós maternos eram os pais biológicos.
Na data em que o menino nasceu, os pais eram toxicodependentes. Sobreviviam e sustentavam o vício à custa do dinheiro que a mãe angariava a prostituir-se. Conscientes da falta de condições que tinham, entregaram o menino, ainda bébé, aos avós maternos.

Ao fim de meia dúzia de anos de uma vida desgraçada, conseguiram deixar para trás o pesadelo que viveram. Procuraram ajuda médica e estão em franca recuperação. Arranjaram uma casa e estão a trabalhar. A levar uma vida digna e honesta. Há quase dois anos.

A mãe quis ver e conhecer o filho, porque os avós lho vedaram até ao momento.
E o tribunal deixou.

É uma mãe com uma força e uma coragem imensas: admitiu, sempre naquela sua maneira um pouco bruta, que a vida lhe talhou, os seus erros, com uma honestidade e uma frontalidade que raramente vi.
 E era de supor que já não me deixo enganar com facilidade, ao fim de tantos anos de experiência com estas situações, e ainda mais de supor que não me comovesse com tudo isto.

Mas comovi.
A alegria, desengonçada naquela mulher demasiado grande para ser delicada, que lhe vi no rosto quando lhe foi dada uma hora de quinze em quinze dias com o filho, em visita supervisionada.
A ânsia de querer cumprir tudo direitinho para conservar aquela hora tão preciosa.

E por isso me zangou tanto.
Ver uma avó que, sem pensar no bem-estar do neto, se recusa a conceder-lhe aquelas horas.
Desde instruir o neto a dizer frases gélidas à mãe até lhe fazer a vida num inferno porque saiu alegre de uma das visitas e criar uma 'guerra de lealdades' porque o que ele gosta da mãe lhe faz falta nos seus afectos, tem sido um rosário infindável de pequenos espinhos.

E tudo porque, não obstante a avó ir à missa todos os dias e bater com a mão no peito tanta mas tanta vez, pobre de Cristo, aquela alminha ainda não percebeu que a essência da religião que professa é uma coisa que ela pura e simplesmente não tem: a capacidade de perdoar.

E, ao contrário do que julguem, não é o ouro que a filha transformou em heroína, nem tão-pouco as discussões e o sofrimento de a ter visto passar por tudo o que passou que a avó não perdoa: não.

O que ela não perdoa realmente é a vergonha de a filha ter sido prostituta atrás do Modelo, que era o supermercado aonde toda a gente da vizinhança ia. E de ter casado com aquele homem, com quem está há mais de dez anos e que é o pai do seu filho.

O resto não interessa.
São minudências de gente ateia como eu, concerteza.

Comentários

Anónimo disse…
abstenho-me, pq entendo o íntimo da avó com a sua honra ferida relativamente à filha.
A ti, sim, um sorriso de amigo de simpatia e compreensão pela situação!
rudi disse…
esqueci-me de assinar no post anterior. Rudi
pin girl disse…
A relutância da avó é de tal forma quadrada, egoísta, mesquinha e com um tal desprezo pelo bem do pequeno que me impressiona muito, de um modo terrivelmente negativo, apesar de todos os motivos que possa ter. Talvez não tenha relatado bem isso no que escrevi. Mas eu sei que percebes do que falo, Rudi. :) Um beijinho com saudades.
rudr disse…
sabes q qd se pretende proteger algo precioso, por vezes a razão dessa proteção apodera-se de nós, e tornamo-nos irracionais à luz dos demais.

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