À espera da chuva
O menino.
Saiu de casa ao princípio da manhã, levado pelo gotejar de luz que nascia entre as suas pálpebras.
Saiu de casa ao princípio da manhã, levado pelo gotejar de luz que nascia entre as suas pálpebras.
Deixou a angústia correr escarpa abaixo até à praia.
E atirou os sapatos, o corpo e o casaco de inverno ao chão como chuva forte.
Não estendeu os cabelos na areia, como de costume.
Recusou-se a deslizar os dedos pelas linhas afiadas das conchas e dos búzios.
E a extorquir notas agudas da espessa cinza do céu.
O menino.
Enregelou os ossos dos pés no banho de grãos.
Inspirou, ofegante, o ar frio que lhe empalideceu as raízes dos braços e das pernas no dia claro.
E embalou, do alto de si e no sepulcro da ausência, a gaivota.
Amassou a angústia na lama do medo e da culpa, secou a mistura rente à pele e, quando escorreu pelos olhos, acobardou-os num simulacro de semicerrar, na vã esperança.
Se a gaivota voasse...
As horas e as garras agarraram fiadas de cabelo e ali, cipreste de braços caídos, esperou, esperou e esperou.
Os pés dormentes ardiam-lhe, encurralados pelo pó escorregadio da maré.
Os dedos das mãos e os joelhos, mastigados pela espera, já não se curvaram na correria das gargalhadas.
E a pele não se enrugou quando os caracóis escuros lhe roçaram o queixo enlameado.
E, agora, na praça no meio da cidade, sugando o ar que espreita, fugidio, narinas acima, no alívio do pedestal, recolhe os vapores dos pratos das esplanadas, adivinha o amontoar das gotículas que escorrem dos copos de cristal e espelha as palavras das conversas e as risadinhas almofadadas.
Se, ao menos, tivesse chovido na praia.
Se, ao menos, a gaivota tivesse voado.
Se, ao menos, o menino tivesse sacudido as garras. E as horas.
E atirou os sapatos, o corpo e o casaco de inverno ao chão como chuva forte.
Não estendeu os cabelos na areia, como de costume.
Recusou-se a deslizar os dedos pelas linhas afiadas das conchas e dos búzios.
E a extorquir notas agudas da espessa cinza do céu.
O menino.
Enregelou os ossos dos pés no banho de grãos.
Inspirou, ofegante, o ar frio que lhe empalideceu as raízes dos braços e das pernas no dia claro.
E embalou, do alto de si e no sepulcro da ausência, a gaivota.
Amassou a angústia na lama do medo e da culpa, secou a mistura rente à pele e, quando escorreu pelos olhos, acobardou-os num simulacro de semicerrar, na vã esperança.
Se a gaivota voasse...
As horas e as garras agarraram fiadas de cabelo e ali, cipreste de braços caídos, esperou, esperou e esperou.
Os pés dormentes ardiam-lhe, encurralados pelo pó escorregadio da maré.
Os dedos das mãos e os joelhos, mastigados pela espera, já não se curvaram na correria das gargalhadas.
E a pele não se enrugou quando os caracóis escuros lhe roçaram o queixo enlameado.
E, agora, na praça no meio da cidade, sugando o ar que espreita, fugidio, narinas acima, no alívio do pedestal, recolhe os vapores dos pratos das esplanadas, adivinha o amontoar das gotículas que escorrem dos copos de cristal e espelha as palavras das conversas e as risadinhas almofadadas.
Se, ao menos, tivesse chovido na praia.
Se, ao menos, a gaivota tivesse voado.
Se, ao menos, o menino tivesse sacudido as garras. E as horas.
Comentários
Peço desculpa pela falta de sensibilidade, mas ao ler o texto com os dedos das mãos...extrapolei para os pés e mais particularmente para o mindinho do nosso amigo Índio :)
kiss