O homem de quem o filme fala...




Averroès

O esforço para integrar o pensamento grego à tradição religiosa islâmica está no centro da obra de Averroès, que exerceu considerável influência sobre judeus e cristãos após garantir à Europa medieval a transmissão -- com comentários -- da filosofia aristotélica.


Um dos principais expoentes da filosofia árabe, Abu al-Walid Mohamed ibn Ahmad ibn Mohamed ibn Ruchd, conhecido como Averroès ou Averróis, nasceu em Córdoba, na Espanha muçulmana, em 1126.

Filho e neto de renomados juristas, recebeu educação esmerada que abrangeu quase todas as ciências e a filosofia da época. Distinguiu-se em funções públicas e devotou-se também ao recolhimento da escrita, deixando textos variados sobre física, medicina, astronomia, jurisprudência, filosofia e teologia. É da sua autoria um célebre compêndio de medicina que circulou nas escolas europeias da Idade Média com o título latino de Colliget. Pouco se sabe sobre a sua vida anterior a 1169, quando foi nomeado cadi (juiz) em Sevilha, cargo que exerceria também, a partir de 1171, em Córdoba.


Comentários sobre Aristóteles.

Entre 1169 e 1195 Averroés escreveu uma série de comentários sobre a filosofia de Aristóteles, detendo-se na análise de obras como Órganon, Física, Metafísica, Retórica e Ética a Nicomaco. Como não teve acesso à Política, escreveu ainda um comentário sobre a República de Platão.


Tais comentários, conforme a sua extensão, tinham três recensões, a pequena, a média e a grande, as quais correspondiam aos métodos utilizados pela pedagogia muçulmana. Alcançando grande divulgação, os comentários sobre Aristóteles facilitaram a compreensão do filósofo e não tardaram a ser traduzidos para o hebraico e para o latim, línguas nas quais seriam preservados, uma vez que os originais em árabe, na sua maioria, foram considerados heréticos e destruídos.


A doutrina pessoal de Averroès, fundada em antecessores da mesma tradição islâmica, como Avicena, está contida em obras como Tahafut al-tahafut, que se difundiu sob o título latino de Destructio destructionis (A destruição da destruição).

A sua teoria do conhecimento baseia-se na irredutível unidade formal do pensamento. A sabedoria humana ou filosófica e a sabedoria religiosa são uma mesma realidade, se bem que o pensamento deva aplicar-se em dois níveis diferentes, o teológico e o filosófico, que chegarão ao mesmo fim.

Filosofia e religião.

Um cotejo entre os tratados religioso-filosóficos de Averroès e o seu comentário à República de Platão mostra a unidade essencial da sua atitude, que procurou harmonizar a lei islâmica, às cogitações do nomos, a lei do rei-filósofo de Platão. Comprova-se, a partir de tal cotejo, que para Averroès só existe uma verdade, a da lei religiosa, que é a mesma em cujo encalço o metafísico se lança.

Tem-se hoje por certo que a célebre "teoria da dupla verdade" -- uma para a filosofia e outra para a teologia -- não foi formulada por Averroès, mas sim por autores que o seguiram na tradição latina, os averroístas.
Ele próprio, aceitando a divisão aristotélica da filosofia em teórica (física e metafísica) e prática (ética e política), constatou que a lei islâmica ensinava ambas na perfeição. Garantiu ainda que a religião se destina a todas as classes, sem a exclusão do filósofo com suas convicções advindas do livre fluir do pensamento.

Contudo, ao insistir nas prerrogativas dos metafísicos para interpretar, como um dever atribuído por Deus, as doutrinas da religião na forma de crenças e convicções correctas (como o rei-filósofo de Platão), Averroès admitiu que a lei islâmica contém ensinamentos que ultrapassam o entendimento humano, mas devem ser aceites por todos os crentes, por se tratarem de verdades que procedem da revelação divina. Tal como as massas e os teólogos, os filósofos, que ocupam uma posição intermediária entre essas duas classes, acham-se definitivamente sujeitos à lei religiosa.

Tendo prolongado uma tradição já antiga de tentativas de síntese entre a lei religiosa e a filosofia grega, Averroès foi além dos seus predecessores, muito embora se encontrasse sob grande influência deles. Fez sua a filosofia política de Platão, modificada por Aristóteles, considerando-a igualmente válida para o estado islâmico.

Em consequência, aplicou idéias platónicas à contemporaneidade almoada e almorávida, convencido de que, se o filósofo não pode governar, deve pelo menos tentar influenciar a política na direcção do estado ideal. O estado ideal de Platão, segundo as perspectivas de Averroès, é o melhor após o estado islâmico ideal, baseado e centrado na lei islâmica como a sua constituição mais perfeita.

Os comentários sobre Aristóteles, que começaram a ser traduzidos para o latim na primeira metade do século XIII, repercutiram-se até mesmo em S. Tomás de Aquino e provocaram uma revolução no pensamento cristão, que até então se baseara no platonismo. Já a teologia de Averroès influiu em autores do século seguinte, como Amalrico de Bena, que ensinava que tudo é Deus e que Deus está encarnado tanto em Cristo quanto no crente.

Apesar do destino que tiveram, as teses de Averroès, ao serem acusadas de heterodoxia, forçaram-no a exilar-se em Marrakech, Marrocos, onde morreu em 1198.



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